quarta-feira, 20 de julho de 2022

Livro: Sal, Açúcar e Gordura: Como a Indústria Alimentícia nos Fisgou

O Demolidor é um filme que mostra um futuro no qual os policiais não usam armas, as pessoas não se tocam quando se cumprimentam, existe multa para quem fala palavras ofensivas e o governo proibiu o consumo de todas as substâncias consideradas prejudiciais à saúde, como sal e cigarros.

Apesar do sucesso de bilheteria, não entrou para o panteão das obras de distopia, talvez por ser uma sátira ao politicamente correto, mostrando um mundo apático e sem graça, claramente vinculado a pautas progressistas.

Lembrei do filme lendo o livro ‘Sal, Açúcar e Gordura: Como a Indústria Alimentícia nos Fisgou’, que fala das estratégias da indústria em nos viciar em alimentos ultraprocessados e de como, a partir da década de noventa, a pressão social por alimentos mais saudáveis começou a agir sobre o governo e as empresas.

O Demolidor é de 1993 e não acredito que ele tenha sido lançado aleatoriamente. Já é bem documentado o quanto Hollywood contribuiu para convencer a opinião pública sobre a Guerra do Vietnã e o consumo de cigarros, então, usar o cinema para defender a liberdade de escolha de comida porcaria não me surpreende.

Uma das cenas mostra o discurso do líder da resistência sobre liberdade de escolha, em poder sentar num bar e se encher de colesterol comendo costeletas e batatas fritas, e é este o argumento utilizado pela indústria para vender salgadinhos cheios de gordura e sal: livre arbítrio e autonomia.


Mas eu queria mesmo era falar do livro, minha sexta leitura do ano. Uma crônica-reportagem no qual Michael Moss conta o resultado de conversas que teve com executivos da indústria, cientistas e técnicos alimentares, publicitários, lobistas e ativistas. Ele também teve acesso a memorandos, atas de reuniões, discursos internos, pesquisas científicas e outros documentos estratégicos que mostram o quanto os ultraprocessados são projetados para atrair a atenção das crianças e confundir os adultos. O quanto seus comerciais usam truques psicológicos e a alta combinação de sal, açúcar e gordura (SAG) estimulam nossas papilas gustativas ao ponto de nos viciar.

Tudo isso é conduzido por profissionais muito bem pagos e com acesso a ferramentas tecnológicas de ponta, e o resultado disso é bem visível: estamos morrendo mais cedo e os cofres das multinacionais que nos empurram essas porcarias travestidas de comida enchem cada vez mais.

Citando nomes, dando referências públicas e datas dos eventos, Moss mostra ser real o que muita gente acredita ser teoria da conspiração.

O Demolidor termina com uma crioprisão explodindo, matando dezenas de presos que estavam cumprindo pena e o Stallone fazendo uma conciliação de classe entre os rebeldes e o poder estabelecido, dizendo que os dois precisam ceder um pouco, o famoso ‘nem eu e nem tu’.

Infelizmente o livro não tem um final feliz, mas também termina defendendo, timidamente, uma conciliação entre Wall Street, a indústria, o governo e os consumidores.

Uma coisa é certa: as pessoas estão morrendo por causa da forma como estão se alimentando, os ultraprocessados são muito mais baratos que alimentos saudáveis e urge uma solução para isso, e a solução não passa pela autorregulamentação do mercado, é preciso que o governo cumpra seu papel constitucional.

Liberdade sem soberania não é nada. Não é apenas sobre escolher o que comprar numa prateleira, é também escolher quais produtos estarão à venda.

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